quinta-feira, 24 de março de 2016



COLUNISTAS

O aneurisma


James Pizarro

por James Pizarro em 10/03/2016
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Corria o ano de 2004. Aos 84 anos, o cardiologista indicou a meu pai uma cirurgia urgente para correção de um defeito. Lembro que ele não queria fazer. Eu fui procurar o médico, meu ex-aluno no cursinho pré-vestibular décadas atrás. Ele me disse que, sem a cirurgia, meu pai morreria repentinamente e que tinha, no máximo, seis meses de vida. O médico me disse que esse diagnóstico não era só dele mas de toda a equipe que acompanhava o caso de meu pai.
Certa madrugada, meu pai me chamou prá tomar chimarrão com ele às 5 da manhã. E pela primeira vez me pediu um conselho :
- O que eu devo fazer ?
Eu disse a ele :
- Tu tens de te operar, o cirurgião é excelente, é decisão de toda a equipe e tu vais viver muitos e muitos anos.
Ele me disse:
- Vou me operar então...tomara que dê tudo certo porque eu quero ver a formatura dos meus bisnetos.
A operação em si foi um sucesso. Mas na sala de recuperação rompeu-se a aorta abdominal, que possuía um aneurisma, coisa que os médicos ignoravam. E ele morreu. Meu avô também morreu assim : ruptura da aorta abdominal.
Fui ao necrotério. Vi meu pai nu, morto. Com cortes e suturas, porque precisaram fazer procedimentos no cadáver, devido à imensa hemorragia interna.
Começaram a chegar os amigos. Lembro que o primeiro foi o “Pinha” (Raphael Theodorico), falecido há poucos meses.Os clubes da Terceira Idade. O pessoal da funerária. Minhas filhas, uma de Itajubá, MG e outra de Panambi, RS, foram avisadas. Meu filho, que mora em Santa Maria, foi nosso companheiro e presença sempre. Minha irmã.
Ele foi velado na sala de sessões da Câmara de Vereadores, pois tinha sido vereador na legislatura de 1958.
Eu aguentei tudo dentro dos limites do possível. Mas quando minha mulher me avisou que meus alunos estavam chegando eu desabei. Olhei e vi aquelas turmas todas, aquela gurizada toda de 15 e 16 anos, dos quais eu era professor orientador. Aqueles olhos assustados com o choro do seu professor. Eu desabei literalmente. A Carolzinha me disse : “Nós pedimos o cancelamento das aulas pra ficar contigo, Pizarro...como tu ensinaste prá gente, que na hora da dor a gente fica junto”.
Dia desses, pensando na fatalidade do DNA, me surpreendi fazendo um ultrassom abdominal para pesquisa de defeitos na aorta abdominal. Ela está íntegra. Sem anomalias. Por enquanto.

James Pizarro

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