sexta-feira, 12 de abril de 2013

O SONHO DO RÁDIO DE PILHA - James Pizarro

Nos anos 50 e 60 o número de agrônomos e veterinários no Rio Grande do Sul era diminuto. Havia uma grande carência de profissionais de nível superior no setor das ciências agrárias.
Quando assumiu o governo estadual o Dr. Leonel Brizola elaborou uma lei de incentivo através da qual os estudantes universitários dos cursos de Agronomia e Medicina Veterinária receberiam um salário-mínimo por mês durante todos os meses de aulaba do curso. Na prática significava que cada aluno receberia oito salários-mínimos por ano.
Fui aprovado no Curso de Agronomia da UFSM, Santa Maria, RS, em 1963 (segunda turma do curso) e passei a receber a bolsa do Dr. Brizola. Os alunos não recebiam a bolsa mensalmente. No início do ano a gente era chamado à Secretaria da Fazenda, em Porto Alegre, e recebia de uma só vez em dinheiro vivo os oito salários-mínimos.
Lembro que no último ano (quarto ano do curso, pois naquela época a Agronomia tinha apenas 4 anos) houve uma crise nas finanças do Estado e os alunos receberra a bolsa em forma de letras do tesouro, as chamadas "brizoletas". As "brizoletas" possuíam respeitabilidade no mercado financeiro, tanto que a gente trocava as mesmas nos bancos pagando por isso um pequeno deságio.
Lembro da primeira vez, no início de 1963, quando fui chamado a Porto Alegre para receber a bolsa no "Tesouro" (nome popular dado ao grande e amarelo prédio da Secretaria da Fazenda, perto da Praça da Alfândega). Todo dinheiro que recebi (oito salários) eu coloquei dentro da pasta da faculdade, uma vistosa bolsa de cor azul com inscrições em letras amarelas.
Atravessei a rua e fui concretizar um velho sonho de garoto pobre. Entrei nas quase solitárias instalações do porto do Guaiba, já decadente, onde encontrei um funcionário vestido apenas de calção. Eu tinha sido informado de que ali se vendiam muitas coisas de contrabando. Disse-lhe que queria comprar um radinho de pilha, que era a grande moda entre os jovens daquela época. Talvez eu fosse o único rapaz da minha turma que não possuísse um.
Ele me pediu para acompanhá-lo e entramos dentro de um daqueles enormes galpões. Havia uma roda de jogo de baralho com vários mal encarados jogando. Ele se dirigiu a um deles que se levantou e me disse : "São 5 pilas pelo rádio, ele tá meio velho mas funciona bem".Na mais santa das ingenuidades de rapaz de interior eu abri a minha bolsa da faculdade e de lá tirei 5 "cruzeiros" (moeda da época). Ele fez uma cara de espanto ao ver dentro da minha pasta aquele monte de dinheiro. Agradeci e saí caminhando apressadamente, quase correndo. Até hoje não sei avaliar o perigo que corri e o porquê de não ter sido assaltado.
Acho que desde aquela época o meu anjo da guarda era muito forte. E muito provavelmente era um anjo que gostasse também de radinho de pilha. Ou naquela época o bandiditismo e
Saí de lá feliz da vida escutando a orquestra do Ray Connif, pela Rádio Guai.

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