segunda-feira, 10 de novembro de 2008

"O CUME" - Modelo de cacofonia...


"Todo lingüista, aquele que se especializa em estudar a linguagem, aprecia brincar com as palavras. Sou um deles. Como não tinha assunto para botar nesta crônica, resolvi falar um pouco da cacofonia. Vou, então, me utilizar de alguns encontros de sons que, às vezes, desagradam os ouvidos. Lembrem-se que há cacófatos, cuja junção da última sílaba de uma palavra com a primeira da que se segue dá origem a uma terceira, geralmente obscena ou engraçada.
Não acho nessas uniões vocabulares nada de desagradável. Pelo contrário, nas horas vagas, são uma das minhas curtições prediletas. Eu as faço não com o intuito de levar os leitores a escrever nossa língua com erros. Quase todos os idiomas dos povos civilizados possuem seus cacófatos. O nosso não é exceção à regra.
Eis alguns deles: "meus amores por ti são / mas se eu pudesse amar ela / talvez eu a maria / entretanto, agora, meu coração apenas por ti gela"; "o irmão, tresloucado, pôs a culpa nela"; "nesse caso, existe uma herdeira"; "já que tinha resolvido, por que não me falou?"; "uma mão boba me apalpou no ônibus"; "eu a peguei de supetão e beijei a boca dela"; "da vez passada, estive na casa dela". Finalmente, um poemeto que poderia se chamar "o cume da montanha". Não é obsceno, porém jocoso. "No alto daquele cume / plantei uma roseira / o vento no cume bate / a rosa no cume cheira. Quando vem a chuva fina / salpicos no cume caem / formigas no cume entram / abelhas do cume saem. Quando vem a chuva grossa / a água do cume desce / o barro do cume escorre / o mato no cume cresce. Então, quando cessa a chuva / no cume volta alegria / pois torna a brilhar de novo / o sol que no cume ardia." O tema, como estão vendo, poderá ser até usado para se fazer uma tese. Quem quiser deverá começar a construir cacófatos, pois há centenas deles no português."
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AUTOR :
Luiz Augusto Sampaio
é vice-presidente da Academia Goiana de Letras
(encaminhado pela amiga Iracema Dantas de Araújo, de Goiânia)

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